sábado, 26 de novembro de 2011

De Passagem

Uma tarde confusa. Nos dias de jogo aquela zona era particularmente caótica. «Benfica!» - Gritava um grupo de jovens, escrupulosamente vestido: cachecol encarnado ao pescoço, gorro na cabeça, sorriso estampado no rosto e, como não podia deixar de ser, acompanhados pela loirinha da praxe.
Entrei no café. No canto mais discreto do espaço, lá estava ela: mergulhada em roupas largas e pouco cuidadas. Os olhos postos num naco de pão, que devorava como se não existisse amanhã.
Acena com um gesto de reprovação, depois dos gritos dos entusiastas vindos da loja ao lado. «Nunca gostei de Futebol. Não era agora, depois de velha, que ia gostar», desabafou. Sentiu-se observada. Olhou para mim e perguntou: «a menina gosta?»
Sorri. Apesar da idade, conservava uns olhos grandes, pintados de um verde que já não existe. Um verde que esconde décadas de memórias que pertencem ao passado. Memórias que ficaram longe de tudo o que hoje está perto.
Acenei em jeito de reprovação. Nunca gostei de futebol. Nunca fui capaz de sentir a mínima frustração pela perda de um jogo, por parte do clube “venerado” pela família. Passou-me sempre ao lado. Ainda que me divertisse imenso perante a indignação do meu irmão (fanático pelo Benfica), e a aparente indiferença do meu pai (um espectador passivo e que facilmente “virava a página”).

Mais tarde percebi, que esse tipo de comportamento reflectia a pragmaticidade com que agia perante tudo na vida.

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